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porIrene Maluf

Uma boa noite

Todos precisam de uma boa noite de sono para poder estudar e trabalhar no dia seguinte. O sono é um dos principais processos fisiológicos para a vida. A sua expressão, alternada com a vigília, é circadiana e sofre influência de fatores endógenos, sociais e ambientais (Foster, 2005).

Mesmo sem informações científi cas detalhadas, esse tema relevante já foi muito tratado em diversos manuais de educação infantil de outras gerações e assunto de inúmeros artigos e discussões, até porque uma criança que não dorme bem sempre sinaliza durante o dia as consequências do descanso entrecortado e incompleto, que chama a atenção da família e professores. É uma questão fi siológica que envolve problemas comportamentais e, portanto, educacionais em boa parte dos casos.

Não é de hoje que se percebem os efeitos negativos (de curto e longo prazo) para a saúde física e mental infantil e que afetam diretamente a aprendizagem em qualquer idade: a atenção fica mais oscilante, a memória, menos operativa, a energia física, depauperada, o humor varia, os acidentes são mais constantes devido à falta do necessário controle de impulsos. Na idade escolar, vemos crianças sonolentas ou muito irritadiças na sala de aula, com péssimo relaciona mento social, difi culdade de acompanhar ou produzir adequadamente como seus pares.

Durante o sono, há um processo ativo de consolidação da memória e reelaboração das experiências vivenciadas, assim como a organização cerebral, que elimina o não necessário, consolida aprendizados e prepara o sistema nervoso para as novas aquisições.

Durante a primeira década de vida, as chamadas ondas lentas do sono são cerca de 40% mais presentes do que na adolescência e diminuem naturalmente ainda mais nos adultos, provando a importância de as famílias observarem com igual responsabilidade os horários do sono e a alimentação e higiene infantil.

Por outro lado, observam-se entre crianças com comportamentos como défi cit atencional (TDA) uma marcante relação com relatos familiares de difi culdades no dormir, na qualidade do sono.

As necessidades de sono são individuais, dependem de fatores diversos, se modificam durante a vida, mas, dentro de um padrão cientifi camente aceito como saudável, podemos dizer que: 1) Bebês até os 3 meses devem dormir de 16 a 18 horas ao dia; 2) De 1 a 2 anos devem dormir de 13 a 14 horas por dia; 3) De 3 a 5 anos, 11 a 13 horas diariamente são necessárias; 4) A partir dos 6 anos, de 10 a 11 horas; 5) Entre 12 e 18 anos, uma média de 9h30 ao dia; 6) Adultos: de 7 a 9 horas costumam ser sufi cientes (Ortiz, 2009). Sabe-se que boa parte do comportamento infantil durante o dia, na escola ou no convívio familiar, está ligada à qualidade do seu sono. Infelizmente, hoje estima-se que 30% das crianças com idade até 12 anos apresentam distúrbios do sono. Inclusive, cerca de 40% dos bebês não dormem bem, comprometendo seu desenvolvimento nessa fase tão importante, quando isso ocorre com complicações mais sérias.

Nos cinco primeiros anos de vida há mudanças na duração, na distribuição e no caráter do sono, e vários fatores podem afetar a criança: medicações, doenças sistêmicas, condições ambientais.

A insônia é a disfunção de sono mais relevante, conforme a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Consiste em uma dificuldade de início ou manutenção do sono, despertar mais cedo que o desejado ou difi culdade em iniciar o adormecer sem intervenção dos pais ou cuidadores.

A rotina de sono pode ajudar muito a evitar problemas do sono e deve estabelecer-se precocemente e basear-se em medidas de higiene do sono e condutas educativas: 1) Estabelecer horário, rotinas e rituais consistentes para o sono; 2) Não barganhar a hora de dormir, nem ser condescendente de modo exagerado em fi nais de semana ou mesmo férias: o sono é um hábito biológico que precisa de rotina para se manter; 3) Evitar estimulação física, mental ou emocional perto da hora de dormir; 4) Ler uma história curta, falar carinhosamente com a criança; 5) Evitar oferecer alimentação durante a noite; 6) Evitar dormir com alguma fonte luminosa durante toda a noite; 7) Habituar a criança a adormecer sozinha, sem a presença física do cuidador, especialmente nessa época em que câmeras são de fácil instalação e podem tranquilizar os pais; 8) Não permitir que a criança durma na cama dos pais e sim preferencialmente no seu quarto; 9) Eletrônicos, telinhas de modo geral não devem ficar no quarto das crianças.

Interessante lembrar que estudos da década de 1990, da Comissão Na cional de Pesquisas em Distúrbios do Sono, nos Estados Unidos, já detectavam que os transtornos do sono eram pouco diagnosticados nas consultas pediátricas. E, infelizmente, quando a intervenção ocorre de maneira tardia, o problema pode persistir por anos, tornando-se um problema de difícil solução e múltiplas consequências. Por isso cabe ao pediatra reconhecer os transtornos e buscar o melhor tratamento para curá-los ou, ao menos, minimizá-los, e cabe aos pais a responsabilidade sobre esse aspecto tão importante quanto a alimentação, higiene e educação de seus filhos.

Artigo publicado na Revista Psique Edição 168.

porIrene Maluf

Autonomia: aprendizado complexo

Vivenciar as frustrações desde a fase inicial da existência é importante para o desenvolvimento. Crianças superprotegidas tornam-se jovens que entram na vida adulta fragilizadas para enfrentar os desafios.

Criar um filho bem-sucedido, seguro de si mesmo, um líder admirado por todos é o desejo de qualquer pai. Mas uma longa construção, que começa no berço, é necessária para se atingir esse objetivo e muitos entraves estão no caminho.


A proteção excessiva é um dos maiores empecilhos e nem sempre é necessária uma dose exagerada de mimos, elogios ou amparo desmensurado para colocar tudo a perder. Amor, atenção, cuidados na dose certa, acompanhados de normas, hábitos sadios e responsabilidade, são o mapa do tesouro em educação. Como conseguir encontrar essa medida para cada filho é o desafio.

O pensamento mais comum entre as famílias condiz com a premissa de que poupar as crianças de vivenciarem problemas desde cedo, evitar dissabores, decepções, vai lhes proporcionar uma infância muito boa, memorável e sem “traumas”, palavra essa usada da forma mais popular e errônea possível. Julga-se que dar aos pequenos a chance de passarem por uma fase inicial da existência sem frustrações antes da chegada da vida adulta, quando certamente os problemas e responsabilidades virão por si mesmos, lhes deixará, além das lembranças, uma base afetiva que fará com que se sintam mais felizes e seguros.

Infelizmente, ocorre o contrário: como atletas sem treinos as crianças superprotegidas tornam-se jovens que entram na vida adulta fragilizados, despreparados para enfrentar desafios, derrotas e vitórias com responsabilidade. Ou seja, acontece que esse modo de levar a educação comprovadamente não resulta nos desejos familiares tão bem-intencionados, mas deságua em um mar de frustrações, pessoas inseguras, imaturas, insatisfeitas, pois não são gradativamente preparadas para os embates da vida nem para a concorrência normal que há no mundo profissional, onde as pessoas mais resistentes ás perdas mais assertivas e motivadas quase sempre ocupam os postos de liderança.

Tudo que é “super” merece, ao menos em educação, um olhar crítico em relação principalmente às consequências futuras. Superproteção é desnecessária e contraindicada porque prejudica, debilita. Superproteger não é sinônimo de amar e cuidar: está mais para desvitalizar, desmotivar, infantilizar e incapacitar. As consequências ultrapassam a própria vítima e atingem toda a família.

Outro ponto importante é que alguns pais tendem a enaltecer desmesuradamente qualquer coisa que os filhos façam com mínimo esforço, assim como satisfazem todos os desejos infantis, dando-lhes uma falsa ideia de poder, inadequado para o crescimento mentalmente saudável da criança.

Muitos pais confundem inteligência e extroversão com capacidade de ser responsável pelos próprios atos. Mesmo inteligente e sagaz, a criança tem limites próprios de sua etapa de desenvolvimento. Crianças só se sentem seguras quando têm um adulto que as oriente e as motive, impulsione, ensine a tomar conta de si mesmas, a serem responsáveis, terem confiança nos seus atos e decisões.

Adultos são responsáveis pelos filhos até que esses sejam maiores de idade, e dizer o contrário não muda a realidade das coisas: a negligencia, tão grave quanto a superproteção, é punida por lei; então, deixar os filhos fazerem o que desejam poderia ser enquadrado dessa forma.

As crianças precisam sentir que há alguém no comando, que cuida e que sabe o que é melhor para elas, mesmo que isso represente a perda de algum privilegio momentâneo. Ao tomarem decisões como adultos, estão na verdade tornando-se pequenos tiranos, coisa que não tem nada de positivo, e, pior, sentindo-se infelizes, pois percebem que seus pais não têm tempo nem dão valor e atenção a eles.

Crianças devem, na verdade, gradativamente aprender a decidir, na medida em que se tornem amadurecidas e capazes de responder pelas consequências de seus atos. Isso pode e deve acontecer desde muito cedo, pois o desenvolvimento da verdadeira autonomia é um processo longo que depende de vivências e experiências de várias ordens, mas necessariamente envolve responsabilidade pelos atos.

Autonomia é um aprendizado complexo, um processo que exige maturidade neurológica, emocional, treino social e apoio familiar. Incentivar, supervisionar, parabenizar são importantes para essa aquisição, pois geram autoestima, segurança e motivação.

Ser autônomo depende da capacidade de prescindir da dependência excessiva dos pais, assim com o do seu incentivo permanente para que se responsabilizem por pequenas tarefas que aos poucos vão se ampliando em complexidade: guardar os brinquedos, amarrar os tênis, escovar os dentes sozinho, arrumar o material escolar, fazer as lições, cuidar de algumas tarefas de casa, gerenciar mesada, escolher entre as opções dadas por seus pais, e principalmente responder por suas (pequenas) decisões etc.

Tornar-se mais flexível, capaz de se relacionar, se comunicar com as outras pessoas e fazer escolhas, desenvolve a sua autoestima, fator decisivo para o sucesso pessoal e profissional.

Só o desenvolvimento gradativo da autonomia na infância permite a construção de uma personalidade saudável e possibilitará o fortalecimento da capacidade de resolver conflitos ao longo da vida e alcançar sucesso pessoal, social e profissional.

porIrene Maluf

Agressividade Infantil

A agressividade é um sentimento natural e comportamentos agressivos são relativamente comuns entre as crianças de 1 a 3 anos, pois estas ainda não aprenderam a controlar seus sentimentos e reações, especialmente a frustração e a raiva que deles decorrem.

Entretanto, ninguém aprende sozinho a dominar sua agressividade: é preciso que os pais e os profissionais da educação que lidam com essa faixa etária estejam atentos, observando constantemente a maneira como os pequenos começam a se relacionar com coleguinhas e com os adultos.

E também, é claro, é importante que pais e professores se prepararem para interferir quando as mordidas, os arranhões e os tapas aparecerem no grupo.

Demonstrações de força física, entre crianças dessa faixa etária, são ações esperadas uma vez ou outra.

Entretanto, se essa conduta está presente no dia a dia, como única forma infantil de demonstrar seus sentimentos de desagrado, raiva, ciúmes, ansiedade e até para chamar a atenção, de modo persistente e difícil de ser controlada, temos que buscar caminhos para ajudar a criança, pois algo não está bem com o seu desenvolvimento.

Na medida em que o tempo passa, as consequências vão surgindo, tais como uma grande dificuldade de lidar de maneira adequada com as outras pessoas em todos os ambientes.

Sua socialização vai se tornando cada vez mais empobrecida, permeada de múltiplos problemas de relacionamento e, decorrente a isso, sua autoestima fica diminuída e frequentemente até sua escolaridade é prejudicada.

Algumas vezes, este comportamento é resultado de uma disciplina familiar excessivamente severa ou, ao contrário, muito negligente. Ainda, pode ser consequência da vivência diária da violência familiar.

O que fazer em casa e na escola para desde bem cedo ensinar os pequenos a demonstrar de uma forma menos violenta os seus sentimentos de desagrado?

Primeiro, quando o bebê começar a bater no rosto dos pais, lembrar-se de que isso pode parecer engraçado da primeira vez, mas que, por conta dessa atitude, toda criança vai entendê-la como de atenção e aprovação e, com isso, ela perseverará nesse hábito agressivo e desagradável.

Espera-se que o adulto, em vez de rir, diga “não” de forma firme (mas calma) e segure as suas mãozinhas, de modo que ela perceba o seu desagrado.

O ideal para modificar esse hábito é tentar conter a conduta agressiva antes de começar. As crianças agem dessa forma quando querem chamar a atenção e quando estão frustradas: portanto, já se tem um indício de quando poderá iniciar esse comportamento.

Se já souber falar, é importante explicar-lhe que tapas, mordidas e arranhões machucam as pessoas, que elas não gostam disso e vão se afastar dela.

Dizer: “Dói quando você me bate ou dói quando você me morde”. Se a criança persistir, mostrar seu desagrado, colocando-a no berço ou chão se já caminhar.

Evite deixar seu filho ou aluno machucar o amigo ou o irmão. No caso de isso acontecer, separe as crianças e atenda primeiro o que foi ofendido.

Isso mostra ao brigão que ele perde sua atenção quando age agressivamente.

Nunca revide no lugar da vítima e nem a estimule para que o faça, pois você estará passando a ideia de que a agressividade é permitida como revide, criando um círculo vicioso.

No lugar disso, quando a situação é repetitiva, eleja uma consequência negativa: não dar atenção por alguns minutos sempre ensina muito mais do que gritos ou palmadas.

Mas se apesar de seus esforços o comportamento agressivo persistir, é melhor procurar um especialista ou o recomendar aos pais se você for o(a) professor(a) da criança.

A experiência vem mostrando que, crianças pequenas que não são ensinadas desde cedo a conter seus ímpetos agressivos, tendem a continuar com esse comportamento ao longo da infância e da adolescência, o que as leva a ser rejeitadas pelos colegas de classe e a se juntar a grupos em que a violência é aceita como regra.

Isso vai gerar um problema de conduta antissocial de proporções e consequências negativas e muito graves.