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Qualidade antes da quantidade: vivendo uma Pandemia

porIrene Maluf

Qualidade antes da quantidade: vivendo uma Pandemia

Estamos vivendo uma situação inusitada e dolorosa, a Pandemia pelo
COVID-19 e por precaução, impedidos de exercer boa parte de nossas
atividades usuais. Isolados em casa, passamos a exercer pelo computador
boa parte de nossas responsabilidades profissionais e a cuidar
pessoalmente da família.


Consequentemente, surgiram encargos extras, normalmente terceirizados
na nossa sociedade, como é a educação acadêmica de nossos filhos, os
serviços domésticos, além do nosso próprio home office. Isso sem falar
sobre a ansiedade com a higienização intensiva devido ao perigo do
contágio pelo novo corona vírus e do cuidado especial com os mais idosos
da família.


A inexistência de uma vacina e de medicação que nos proteja a curto
prazo dentro desse cenário global, acrescenta inquietação e medo a todos
nós.


As aulas escolares foram suspensas e os alunos ficaram sem sua rotina
usual, quando um período do dia era ocupado com a escola e o outro com
as aulas extras e as tarefas acadêmicas em casa. Há expectativas que a
situação não mude em menos de dois ou três meses e aí surgem as
dúvidas sobre como manter a aprendizagem escolar presente na vida de
nossos filhos.


É certo que não dá para colocar o cérebro infantil em férias nesta época
do ano, mas a situação de confinamento faz muitos pais exagerarem na
expectativa de manter o ritmo de estudos das crianças e adolescentes
como era antes. Muitas escolas se desdobram para sustentar aulas online
e quando isso é possível e acessível, especialmente no ensino médio e
superior, apesar das adaptações necessárias, o estudo segue praticamente
de acordo com o esperado.


Entretanto há casos em que, pela pouca idade ou mesmo imaturidade
infantil, os pais precisam assistir as aulas online com os filhos e/ou
recebem de a escola tarefas escolares para os alunos fazerem
diariamente. Consequentemente é preciso inserir a criança em uma nova
rotina e uma parte seguramente terá dificuldades em seguir essas novas regras. É uma reação natural e própria da infância, especialmente se a
criança já tiver dificuldades com o aprendizado escolar.

Seja em qual for a circunstância, uma reflexão se faz necessária: estamos
vivendo um momento inédito em nossas vidas e o acúmulo de tarefas e
preocupações dos adultos, pode fazer com que se tornem por demais
exigentes ou excessivamente negligentes com a criançada.


Pais não são professores e a ideia que fazer a lição de casa com os filhos
proporciona aos adultos de que os estão ensinando, agora é transformada
na prática. É muito mais complicado do que parece, requer mais tempo e
conhecimento especializado substituir o professor.


Uma coisa é ensinar e outra é apenas supervisionar diariamente as tarefas
da lição de casa. Uma não dispensa o ambiente e o conteúdo planejado, o
profissional especializado na escola, os recursos e estratégias apropriadas
para transmitir novos conhecimentos gradativamente e presencialmente
em grande parte. Outra requer orientar (quando não ajudar mesmo) e
incentivar a criança a fazer pesquisas na internet, ler livros, escrever,
responder questionários, estudar textos etc. Para a primeira é preciso ser
profissional da educação. Para a segunda, a atenção, o carinho familiar e
tempo são indispensáveis.


É importante lembrar que a educação não é mais como no tempo das
nossas avós, quando as cartilhas bastavam para os pais ensinarem seus
filhos, pois era com esses livros que os adultos tinham aprendido também.
Hoje, a grande maioria dos pais não tem como explicar de modo
atualizado a matemática, a gramática, as ciências.


A escola não substitui a família e vice versa. Cada qual tem sua
importância na educação e manter o respeito pelos limites de papeis,
responsabilidades, é muito importante. Assim quando voltarmos aos
nossos afazeres após Pandemia, à escola caberá resolver as questões de
reposição das aulas e de conteúdo acadêmico. À família cabe agora, algo
mais do que apenas exigir que as tarefas sejam cumpridas: fazer com que
o período seja rico em vivencias familiares, amorosas e cheias de
aprendizagens de vida diária, que aliás andavam mesmo um pouco
esquecidas.


Encontrar um meio termo em que pais e crianças fiquem harmonizados,
também é importante e não tem receita, mas tem orientações. Isso porque de repente, frente a tantos riscos com a saúde, o conteúdo
acadêmico perde um pouco o foco, mas a aprendizagem de vida se torna
mais prática e emergente: o frango que vai ser assado para o almoço veio
mesmo de onde? Vamos pesquisar como são criadas essas e outras aves
nas granjas? E como são plantados e colhidos o feijão, o café, como o
açúcar fica tão branco e fininho? Como chegam ao supermercado? Por
estradas de ferro e de rodagem que tem técnicas especiais para serem
construídas, não é? E como mesmo é que surgiu a internet? Há crianças
que nunca plantaram um feijão no copinho com algodão e outras que
nunca viram como um bolo é feito.


Um planejamento equilibrado com horários bem estipulados de revisão de
conteúdos escolares, aquisição gradativa de aprendizados novos, pode ser
admissível desde que outros horários sejam repletos de atividades
estimulantes, como brincadeiras, participação nas tarefas caseiras,
horários demarcados para TV e internet, jogos com os irmãos e os pais.


Muitas atividades escolares podem, em comum acordo com as escolas ,
serem ministradas de forma que a família não se sinta obrigada a
acompanhar as crianças nas tarefas , já que não vivemos um período de
férias : adultos continuam a fazer o próprio trabalho de casa, mais os
afazeres domésticos e os cuidados gerais com os próprios pais idosos.


Controlar e acompanhar as atividades escolares é importante (sim!) e por
isso é preciso que estas se harmonizem dentro do planejamento familiar e
não sejam um peso tão grande que obrigue pais a se transformarem em
professores e os professores a se desdobrarem em atividades que antes
não lhes competia , por horas diárias em que inclusive não trabalhavam
antes e que agora lhes tira a oportunidade de atenderem as próprias
famílias.


O aprendizado escolar, é importante sempre, mas não estávamos
preparados para transformar a escola presencial em online de uma hora
para outra. Essa passagem deverá ser pensada com muito cuidado daqui
para frente, pois se mostrou possível se bem adaptada. Mas neste
momento, parcimônia é o melhor remédio, para evitar estresse familiar,
brigas entre pais e filhos, que acabarão perdendo a oportunidade de
estarem juntos de uma forma construtiva. Novos hábitos podem ser
criados em família nesta quarentena, que vão ser lembrados para o resto de suas vidas e tornarão as crianças e jovens serem mais resilientes frente
as dificuldades inesperadas.

Como lidar com as crianças em casa durante a quarentena?


1-Explicar de modo simples, adequado à idade, o que é uma Pandemia, o
Covid-19 e o significado de quarentena para que entendam minimamente
a situação e se cuidem. A ignorância cria muitas fantasias, até bem piores
que a realidade;


2-Adultos estão mais tensos e preocupados que as crianças, mas estas
podem estar aflitas sem conseguir falar a respeito desta crise. Abrir o
diálogo, comentar as reportagens assistidas é muito importante para
manter a saúde mental de toda a família;


3-Sem amedrontar, esclarecer sobre o perigo da contaminação e as
consequências que a falta de higiene pode acarretar;


4-Manter diálogo sempre aberto para falar das formas de prevenção, de
higiene e dar exemplos de como se proteger e proteger a família;


5-Estabelecer um programa diário de tarefas caseiras: as crianças gostam
de se sentir uteis, importantes e aprender coisas novas que dificilmente
aprenderiam na escola;


6-Explicar que os avós e outros adultos idosos, devem ser lembrados e
visitados pela internet ou telefone todos os dias, como forma de cuidar da
saúde dele se lhes proporcionar alegria, mesmo na quarentena. Além
disso, tal comportamento vai reafirmar às crianças a importância delas
para toda a família, mesmo em uma época tão difícil.


7-O aprendizado escolar terá em muitos casos que esperar, pois pais não
são professores. Mas, estimular a leitura diária é importante sempre e em
todas as idades. Anotar os mantimentos em falta, preparar a lista de
afazeres diários fazer as contas dos gastos ajuda a entender a relação da
escola com a vida real.


8-Bons livros e filmes podem e devem ser vistos em família e discutidos:
os adultos podem perceber o nível de compreensão das suas crianças e
entender melhor ate mesmo as queixas dos professores nesse sentido;

9- Se seu filho tem problema de aprendizagem eis um momento para ele
mostrar um bom desempenho e ser elogiado ao fazer coisas práticas nas
quais pode se sair muito bem. Peça orientação ao Psicopedagogo e
mensure a possibilidade da criança continuar com alguns atendimentos
online.


10-Se a criança estiver desocupada, não a mande simplesmente estudar,
mas peça sua ajuda para uma tarefa que de modo indireto a obrigue a ler,
escrever, fazer contas. Verdade que o período não é de férias, mas poucos
pais conseguem fazer com que a criança estude em casa sem a rotina
escolar. Estudar não é castigo!


11 Crie em um período do dia, um momento para as brincadeiras e jogos
em família. Deixe correr a imaginação, se mostre disposto a aprender
coisas novas e participar da brincadeira também.


12- É uma excelente hora de mostrar que a internet é mais que
WhatsApp, Facebook, jogos eletrônicos…que tal desafios com perguntas
interessantes que devem ser respondidas ate o final do dia? Todos na
internet e nos livros para buscar respostas! E que tal visitas virtuais a
museus, em família?


Pense que a Epidemia vai terminar, vai deixar uma lembrança para toda a
vida dos pais e dos filhos. Vai deixar um aprendizado também. Que tal
fazer que a lembrança seja da união da família em meio a todas as
dificuldades e o aprendizado maior seja o valor da cooperação, do
respeito e da compreensão.

Sobre o Autor

Irene Maluf editor

Pedagoga; Especialista em Educação Especial; Psicopedagogia e Neuroaprendizagem. Foi presidente nacional da Associação Brasileira de Psicopedagogia -ABPp (triênio 2005/07) e Editora da Revista Psicopedagogia (2003 a 2016); Atualmente é membro do Conselho Vitalício e da Diretoria Executiva da ABPp além de participar do Conselho Executivo da Revista Psicopedagogia.Organizadora, co-organizadora e co-autora em diversas publicações no Brasil e Exterior e autora de artigos na área da Psicopedagogia e Neuroaprendizagem em livros e revistas nacionais e internacionais.Palestrante em cursos e congressos no Brasil e no exterior. Sócia-Honorária da Associação Portuguesa de Psicopedagogos (2003). Trabalha em consultório de psicopedag ogia desde 1976, com experiência na área de Educação Regular e Especial, ênfase em Psicopedagogia e Neuroaprendizagem. Participa de grupos multidisciplinares .Perita Judicial . Diretora do Núcleo de Aperfeiçoamento Profissional em Psicopedagogia e Neuroaprendizagem Irene Maluf. É Coordenadora Pedagógica dos cursos de pós graduação Lato Sensu do Instituto Saber Cultura/FTP- Núcleos Sul e Sudeste Brasileiro- em Neuroaprendizagem, Transtornos do Aprender, Psicomotricidade, Cognição e Psicopedagogia, desde 2009 e do Mestrado em Ciencias da Educação da FTP/Unades.